domingo, junho 24, 2007

História de hoje: Ele dormia de luvas!?


Sandra era assim: loira artificial, estatura média, olhos castanho-claro, 34 anos, secretária bilíngüe de uma multinacional. Namorava há três anos Arouca, um ciumento rapaz com quem já não tinha um relacionamento instável. Brigas e brigas eram o cotidiano – o amor não existia mais.
A ascensão profissional da moça contrastava com o declínio do seu companheiro – que estacionara no cargo de vendedor de convênio médico -, mas não era por isso que a relação não prosperava. Sandra estava contando as horas, esperando o momento preciso para dar uma basta naquela história, estar livre para a vida, para amar de novo.
Demorou, mas este dia então chegou, e foi drástico para Arouca. O rapaz não aceitou, chorou, pediu chances, e num misto de tristeza e raiva se despediu em vão com um abraço calado, frio e sem alarde.
Pouco tempo depois, Arouca deixou na portaria do prédio onde a moça morava alguns objetos que ganhara dela nesses três anos: cd´s, livros, cartas, uma caneta, uma gravata, uma aparelho de barbear... Sandra entendeu que o seu ex não queria ficar com qualquer vestígio dela em sua vida, e ao se deparar com aqueles objetos, ficou com os que considerava neutros (cd´s e livros) e jogou o resto fora.
Por um instante, percebeu que Arouca se esquecera de lhe entregar alguma coisa, mas não se lembrava.
Os dias que se seguiram passaram lentos. Sandra ia degustando sua liberdade aos poucos; aos poucos o peso de Arouca ia diminuindo... Ia rarear até desaparecer totalmente.
Numa segunda-feira, Sandra saiu para o trabalho bem vestida e perfumada como de costume, trabalhou o dia todo, fez contatos com clientes internacionais, organizou a agenda de seu diretor, e já no final do expediente foi chamada à sala de seu superior para ficar ciente da sua promoção e transferência para o sul do país – a carreira da moça dava mais um salto.
E quase que saltando de alegria contou a todos: aos colegas de trabalho, aos pais, aos amigos e se lembrou de Arouca rapidamente, pessoa que talvez não visse mais.
Ao chegar em casa, cansada e feliz, a moça foi até a cozinha guardar algumas coisas na geladeira e tomou um copo d’água rotineiro. No caminho, deixou a bolsa na sala e se dirigiu ao seu quarto com a incumbência de tomar um banho relaxante.
Foi quando quase morreu de susto ao ver em sua cama Arouca, o ex-namorado, dormindo... Ficou ali, perplexa, sem saber o que fazer. Notou que o rapaz tinha vestido nas mãos luvas de borrachas, brancas, transparentes, cirúrgicas e foi se aproximando para acordá-lo sem entender nada.
E ao tocar no rapaz, viu o brilho reluzente de sua faca de cortar carnes tramontina, como um raio, pegar de raspão em seu ombro esquerdo, e a mão grande do seu oponente tapar-lhe a boca, impedindo a de gritar.
O golpe foi preciso e Sandra mal conseguia respirar, enquanto o rapaz fora de si dizia que sem ela, ele não viveria mais e que por isso ela teria que morrer também.
Ela não teria escolha: ou voltar para ele ou morrer...
Sandra sentia o cheiro forte do látex das luvas, e o medo da morte – sua vida inteira passou num segundo -, e num instante conseguiu agarrar o abajur de aço inox em forma de barra que ficava na beira da cama e atingir em cheio a cabeça do seu agressor.
Ele caiu cambaleante e sangrando, e ela fugiu pela porta da frente gritando socorro para o porteiro, morta de pavor.
Arouca se recuperou a tempo e pulou o muro do prédio como um felino assustado, entrando em seu opala 1978 azul, cantando pneus pela avenida afora.
E a moça ainda muito nervosa, foi socorrida por vizinhos e encaminhada à delegacia mais próxima para denunciar José Carlos de Melo Arouca por tentativa de homicídio.
Sandra, depois do susto, imediatamente mandou trocar todas as fechaduras do seu apartamento e adiantou sua ida ao sul.
Quase que a moça não muda de cargo...
Recentemente, Sandra esteve por aqui para prestar alguns depoimentos sobre o crime passional do seu ex-namorado, e aproveitou para passar a noite com um amigo meu que me contou tudo. Dizia ele assim: - Dá para acreditar, o cara dormia de luvas!?


"Qualquer semelhança é mera coincidência".

Nilson Ares, junho de 2007

9 comentários:

Anônimo disse...

Sera que o Caco Barcellos te da uma brecha no futuro livro dele?mas companheiro,daqui a uns 2 anos pode ter conhecidos nossos dormindo de luvas....

S. Farias disse...

aí está...ele, de volta ao blog de verdade. Gostei do cheiro do látex...e do opala 78, tem alguma coisa de continuidade, não tem não?
Valeu.
S. Farias

Alê Marques disse...

Preciso confessar:
- Eu já comi a Sandra!E o Arouca sabia!

Anônimo disse...

Vai nessa linha meu caro.

Tito,o Frei

André Luiz Rozaboni disse...

Esse caralhão anonimo ai em cima????quem que é?Frei?cade a porra da transparencia?não respondo por Tito,ok galera.

Marcio disse...

gostei do final! me surpreendeu, ri muito!

Marcio disse...

folhetim é legal hein!

Nilson Ares disse...

Valeu caros correligionários.

Anônimo disse...

Baseada em fatos reais, muito bom!!
Vc é o cara!! casquei o bico quando li rsrsrs...