sexta-feira, novembro 28, 2008

Arena das Morfinas


A propriedade da palavra

Não é minha nem sua

Só me pertence quando levo meus órgãos a emiti-
la

Depois disso ela entra dentro do sistema de signos e códigos

Que a transforma em coisas, cheiros, dinheiros, objetos...

E que extraem das estantes sociais

Significados que às vezes não servem para nada.

segunda-feira, novembro 24, 2008

Ensaio sobre a cegueira


Há muito o que dizer sobre está maravilhosa obra de José Saramago, entretanto, ponho-me somente a falar dos nomes dos personagens. Ora , fato é que os personagens não tem nomes , eles são simplesmente a mulher do médico, o garoto estrábico, a prostituta de óculos escuros, o médico, o ladrão e por aí vai.
O nome nos referência , mas quando a cegueira é tamanha , a tal ponto de todos estarem cegos o nome em si parece não fazer tanta diferença assim.
Em muitas culturas o nome revela o caráter da pessoa , suas características, como ocorre na cultura crista quando Jesus fala a Pedro: " Tu és pedra, e sobre ti edificarei minha Igreja". Veja que Pedro era o mais tosco dos discípulos , munido de uma "ignorância", a ponto de remover a orelha da pessoa que tocou o mestre no monte das Oliveiras. Casos parecidos veremos na cultura grega com o Deus cronos , o virtuoso Deus do tempo , donde advém a palavra cronômetro. Do povo negro temos a palavra baderna associada a mulher chamada Maria Baderna, foi uma revolucionária na época e por não aceitar a escravidão os senhores a chamavam de baderneira. O que não falta é exemplos.
Saramago nos engana profundamente pois seus personagens são a escória e o imprevisível e apesar de não ter nomes , representam características de coragem, ódio, traição, amor e sentimentos que os seres humanos carregam consigo.


Hemerson

sábado, novembro 22, 2008

Espaço Futebol: Muito além da vitória e da desorganização



Na coluna passada usei de uma piada popular com o Corinthians para homenagea-lo pela conquista da segundona. O texto teve talvez o maior numero de comentarios no blog desde sua fundação.

Alguns vibraram e outros rejeitaram a conquista. Os que vibraram são apaixonados que comemoram até "2 ou 1", desde que eles sejam vencedores. Os outros são torcedores mais intelectualizados com o futebol, seu time e seus bastidores, vendo que pelo seu tamanho e dimensão ele devia estar muito acima de conquistas assim. Nessa epopéia corintiana, concordo com esses.
E olhem que me coloco a vontade para falar de Corinthians em alto nivel. Juca Kfouri, Chico Lang e Sócrates se classificariam melhor mas Toquinho jamais...nem deve saber escalar o time de cabeça.

Quando escolhi meu time adorava ver o Silas jogar. Me maravilhava em ver como o Careca marcava gols, admirava ver a explosão e vontade do Muller no ataque e lamentava não ver , pelo menos lúcido, o Falcão com a camisa do time.
Em seguida veio Zetti(em baixo da trave não vi arqueiro melhor), Raí, Pintado, Leonardo até a instituição Rogério Ceni.

Mas me lembro também e muito bem quando descobri a grandeza do Corinthians. Não foi em 90 como muitos chutam , mas sim em 1988 em uma final contra o Guarani em Campinas onde Viola fez o gol do titulo em uma prorrogação contra um time muito melhor jogando em sua casa.
Jogavam Ronaldo, Edson Boaro, Biro-Biro, Éverton..jogadores que pouco fizeram em qualquer outro lugar mas que la encorporarm uma sujestiva raça e vontade. Os verdadeiros "inimigos"dos times adversários em uma linguagem futebolistica claro;;
Isso se manteve até a conquista do Brasileirão de 1990, mas o qual mais via o lançamento de um futuro esquadrão São-Paulino do "seu Telê", do que um campeão merecidamente.

Após isso cada clube dentro de sua grandeza escolheu seu caminho.

O São Paulo desistiu de contratações milionarias, formou ótimas divisões de base, profissionais liberais de diversas areas na gestão do clube, parcerias convenientes, marketing altamente ativo, salários em dia e conquistou todos os titulos mais importantes que disputou com destaque para 3 titulos mundiais e 3 titulos sul-americanos.

Ja o Corinthians usou do jeitinho Brasileiro para enfiar a corda no seu próprio pescoço. Terceirizou sua base, colocou ladrões e corruptos na sua direção, perdeu dinheiro, dignidade, prestigio e o pior de tudo, diminuiu maçiçamente seu crescimento popular nesses anos.
Conquistas aconteceram(um paulistinha aqui outro ali), porém mascaradas por seguir a contra-mão de toda linhagem correta de administração. Fez parcerias com criminosos mundiais que usaram o clube como uma bela maquina Brastemp colocando medalhões do futebol mundial no time por alguns meses, venceu um campeonato arranjado e esses enchiam seus bolsos em contas russas enquanto o clube agonizava...mas ai todos se foram, o rombo ficou e o time caiu!
Hoje, apesar da falta de profissionalismo reinar ainda, algumas pessoas que realmente amam o clube estão tentando limpar sua marca e aumentar novamente seus limites. Dentro de sua realidade o titulo da série B com um modesto e bom time(time= quando 11 jogadores independente de nome ou prestigio desempenham um bom futebol coletivamente)foi merecido e deus queira que não haja futuramente um plano para o bi.
Muitos dizem que o hoje o São Paulo é um modelo de administração empresarial para justificar suas conquistas e minimizar a paixão de seu torcedor. Mas montando um bom time , com um competente treinador(que sera 3 vezes seguida campeão Brasileiro), nada mais do que jogar para vencer sera a obrigação deles se seus direitos estiverem em dia. Será o primeiro tricampeonato do São Paulo em sua história. E esses atletas estarão nela.
Domingo que vem , ao levantar a taça Rogério Ceni escutara do torcedor são-paulino nas arquibancadas o coro "É Cam-peão" e não o inédito "O-bri-gação".


PS: Santistas!!! vocês com essa familia de turcos colocando dinheiro la e sacando anos depois com juros de cartão de crédito;;se preparem;;serão os proximos a assistir jogos terça e sabádo logo, logo..

terça-feira, novembro 18, 2008

A saga de Maria Gorete ou... Todo mundo espera alguma coisa do sábado à noite.

Estávamos eu e meu grande amigo Zamah (ou Zamá) a rondar a cidade, numa noite fresca e devidamente enluarada de sábado; nosso desejo era o de parar em algum bar, pedir uma cerveja bem gelada e, - como rapazes solteiros, bonitos e gentes de bem que somos -, observar a beleza de nosso mulherio joseense, e bater papo, jogar conversa fora.
Estacionamos quase em frente ao Bar Pimenta e depois de caminhar por toda a extensão da rua, que inclusive abriga outros estabelecimentos para bebericagem, vimos que a paisagem local até que era bela, mas repleta de ninfas com seus namoradinhos ou coleguinhas espinhudos e surfistinhas precoces de gel no cabelo, munidos de carrões do papai ou da mamãe com “putz- putz” ou reggae ligados no dez.
A praia ali definitivamente não era a nossa! A idade pesou. Nos sentimos meio “Gaspar”; aquele personagem surfista quarentão que Nuno Leal Maia interpretou na novela global Top Model, de 1990, com cenas nostálgicas relembrando o passado ao som de “Stairway to heaven” do Led Zeppelin.
Então, pegamos o carro e demos seqüência ao tour passando em frente outros bares como Original, O Funil, O Botequim até finalmente ir parar no Rapsódia´s, o qual estava tão perto quando saímos de casa, em Santana, zona norte.
Lá o ar estava bom. E a casa cheia. Cheia de caboclas na faixa dos trinta e quarenta; algumas lindas, outras bonitas e outras já na série C do campeonato, beirando o ostracismo, prestes a parar de competir.
Loiras, morenas e branquinhas; magras, formosas e gostosas mesmo, fizeram a gente se sentir em casa enchendo o rosto de sorrisos: agora sim, estava tudo nos conformes.
Entre uma e outra cerveja falávamos de tudo um pouco, ao mesmo tempo em que comentávamos a beleza feminina presente, bem colorida e variada. Coisa tão boa é observar as mulheres.
Ficamos do lado de fora do bar, filmando as fêmeas feito lobos do alto da colina em busca de ovelhinhas suculentas, enviando pelo ar doses cavalares de testosterona, de sugestão, de disposição em ver alguma paradinha (tamo no jogo!, como diz o sábio e agora magro Charles de Lima, vulgo Pelote).
Estava tudo muito bom, muito bem... E lá pelas tantas horas da madrugada fresca, eis que surge então, da parte baixa da Rui Barbosa, ali mais ou menos à altura do Cine Santana, cambaleantemente ébria, falando com o nada, tateando o ar, desviando do poste, ajeitando as alcinhas marotas de sua blusinha justa, delineando uma barriguinha de uns 20 anos de cervejinhas acumuladas: uma mulher mirando a reta tentando acender um cigarro parecendo enxergar dois, quase queimando a mão, tropeçando em si mesma... Na capa do batman, como diz Eduardo Macumba.
Vi tudo isso de soslaio,- bem pelo cantinho dos olhos-, e ainda tive tempo para pedir a deus que ela não se enroscasse em nossa mesa, mas ela foi se aproximando, chegando perto, mais perto, bem perto, pertinho agora, até que: - Aí bonitão, dá licença que eu vou pedir uma gelada para a gente, pode? Demorei a responder, virei para o meu amigo e ele disse baixinho, deixa né, fazer o que...
Fazer o que! Aquela senhora chapada vinha de um forró dali de Santana mesmo, daqueles tipo “rancho da goiabada”, junto a faraós, índios, piratas, pais-de-santos, balconistas, engraxates e frentistas, em busca de ser amada; mas a noite parecia ter sido em vão.
Disse que morava próximo à COOP, e que iria tomar uma e depois partiria a pé. E eu completei, “é pertinho, tá uma noite gostosa’. Mas ela não gostou muito não, e me repreendeu alegando uma falta de cavalheirismo absurda, “ora moço, pensei que iria me oferecer uma carona, você não tem carro não? Esses homens de hoje... A coroa suspirou com um bafo de cachaça barata e de cigarro “estoura peito”.
E ali ficou embaçando nossa ilustre “convidada”. Pediu meu telefone, e lógico que eu não dei. Disse para ela que a vida é a arte do encontro, e ela indagou: de quem? do encontro? Ah tá...?!!
Até que depois de algum tempo infinito, o celular dela toca e ela passa algumas coordenadas para um rapaz que chegou dez minutos depois, de moto. Era aparentemente bem mais jovem que ela o aventureiro. Diria sobre o rapaz, nosso Coronel: destemido, peito de remador, um legítimo brabo.
E para fechar com chave de ouro, aquela dama da noite quase caiu da garupa ao subir na moto, quase precisou de ajuda; mesmo assim não perdeu a pose. E com umas das sandálias que calçava agora arrebentada pelo pequeno enrosco, se despediu da gente toda sorridente, sumindo pela madrugada, dando continuidade à sua saga particular. A saga de Maria Gorete, 47 anos, desquitada, desempregada e facílima. “Vai com deus!” Disse o meu amigo, “vai com deus, coitada”.

Nilson Ares

segunda-feira, novembro 17, 2008

Conversa pra boi dormir

A bienal de São Paulo é conhecida como um dos maiores e mais importantes eventos de arte comtemporânea do mundo. Sua primeira edição foi em 1951, numa tentativa de empresários da indústria emergente de modernizar a cidade e desenvolver a sua atividade cultural. Desde então, a bienal trouxe artistas e trabalhos de artes que apresentavam novos problemas e propostas para a arte, em âmbito internacional. E a despeito de algumas curadorias duvidosas, as exposições sempre aconteceram e sempre promoveram debates interessantes sobre as questões artísticas.
Quem sempre visita a Bienal de São Paulo, sabe que é impossível ver todos os trabalhos exibidos em uma edição. Algumas exposições anteriores eram realmente impressionantes, por seu tamanho e ousadia: geralmente há tantos artistas que participam, e tantas coisas interessantes a considerar igualmente, que para a maioria das pessoas é inevitável uma maior ou menor expectativa a cada nova edição.
Visitar a atual edição da Bienal de São Paulo, de número 28, entretanto, é uma experiência muito desapontadora. Parece que, pela primeira vez, a bienal não aconteceu.
O debate sobre “o que fazer” com esta 28ª edição iniciou no ano passado, momento em que ninguém sequer possuía interesse em assumir a sua curadoria. Com a Instituição da Bienal passando por uma grave crise, ninguém queria ter seu nome ligado com a presidência da fundação, acusada de corrupção. A última edição da Bienal teve problemas com pagamentos e financiamento do material gráfico, além da suspeita de que o nome de artistas renomados estava sendo usados para facilitar desvios de dinheiro.
No início deste ano, Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen decidiram assumir a curadoria da atual edição. A despeito de todo debate entorno da crise da instituição, eles decidiram manter a sua primeira proposta de apresentar um andar inteiro do prédio da bienal totalmente vazio, como uma metáfora do “momento vazio” que a instituição estava passando.
Exatamente como eles projetaram, quando se entra no prédio, o que se vê é o vácuo. O primeiro piso contém nada mais que alguns vídeos documentando performances realizadas em edições passadas. O segundo pisso é o “andar vazio”. Quando se está nele, pensa-se com pesar em todos os trabalhos e obras que poderiam estar ali, afinal não é a arte e o trabalho artístico, bem como a sua importância, que está em crise. Estes continuma acontecendo por todo lado. E no último piso, alguns trabalhos aqui e acolá- e a maioria deles são igualmente referentes a edições passadas, nada de novo. O trabalho mais visitado é um escorregador em forma de tobogã de Carsten Höller, que tem um postura um tanto crítica ao que as exposições de arte se tornaram; porém parece um brinquedo no meio de um vácuo deprimente. Em vez de denunciar a situação real da instituição, o " andar vazio” da curadoria parece escondê-la. O discurso sobre o vazio metafórico e o anúncio que esta edição seria um intenso e novo momento para a bienal não passou de conversa fiada. Está claro que não houve tempo para preparar uma bineal de verdade, e não haver bienal seria um grande problema para a instituição. Os trabalhos exibidos têm suas importâncias, mas não constróem nem sugerem nada que se pareça com uma retrospectiva de exibições anteriores, como indicado pela curadoria. Mais parecem escolhidos ao acaso, ou ao sabor da conveniência. Não há um pensamento sobre a importância histórica do evento para o país e para o mundo, não há questionamentos e propostas para a crise. Há apenas a aparência de uma denúncia que não existe. E para a maioria das pessoas, fica o sentimento que tem alguma coisa errada ali, mas enquanto escorregamos no belo tobogã metálico em direção ao chão, vamos deixando isso pra lá.


Luciana Bertarelli
Marcio Elias

sexta-feira, novembro 14, 2008

A Cidade

Ruas sem fim, artérias.
Avenidas sem fim, asfalto, imensidão.
Céu cinza.
Almas insignificantes.
Luzes somem no horizonte
E a cidade não termina.
Prédios, casas, viadutos.
O tempo gastou a paisagem
E tudo ficou consumido pela noite.
Almas cansadas.
A cidade nos devora
E impõe seus caprichos.
Rainha tirana, alma sombria, ser cruel.
Nós estamos em você,
No teu sangue escuro,
Nas artérias obstruídas,
Nos desvãos do seu corpo.
Às vezes você aparece despida
Sem maquiagem, nua.
Apenas seus olhos parecem vestidos
De tristeza, de dor e nuvens escuras.
Eu tentei evitá-los,
Mas somos um amor proscrito
Inevitável, seres entrelaçados
Vontade de fugir, necessidade de possuir
Impulsos tiranos, alma afogada
Um corpo boiando no córrego sujo.
Água, detritos industriais, lixos
Beijos tóxicos,
Libertação asfixiante
E outras saudades.


Jorge Pessotto

quinta-feira, novembro 13, 2008

A Sequidão da Palavra


A economia da palavra, dos adjetivos, dos arranjos semânticos, a sua contenção, as sentenças lancinantes e a precisão dos períodos fizeram com que eu relesse Vidas Secas em duas noites dessa semana.

Mas do que uma aula de regionalismo e critica social de Graciliano me impressionou a análise feita da descoberta da linguagem. Um dos personagens, Fabiano, sofre de um déficit de vocabulário e uma dificuldade da língua corrente que o impossibilita de tomar uma série de iniciativas em sua vida.

Em uma das passagens do livro este personagem é preso por não conseguir argumentar com o policial sobre uma dada situação, em outra, mesmo sabendo que está sendo explorado pelo patrão também sente uma dificuldade em resolver o problema por não conseguir articular de maneira eficaz sua argumentação com o dono da fazenda.

É através desta contenção que Graciliano soube carregar semanticamente cada parágrafo deste livro com a sequidão do sertão, é possível ver a caatinga, as árvores retorcidas na língua travada dos personagens, os galhos ressequidos de uma vegetação decidual que perderam a capacidade de argumentação junto com suas folhas. Forma da escrita de Graciliano assume o conteúdo do livro.

E esse fato me pôs a pensar, de onde brotou e vicejou tanta sequidão, de onde veio tão poucas palavras pobres? Tomando por parte o próprio materialismo de Bakhtin, a pobreza destas palavras brota da própria pobreza material. A organização material determina contraditoriamente a formação do signo lingüístico.

O suporte do signo é necessariamente material para Bakhtin, como toda articulação material é histórica e dialética, o signo também assume essa forma, e por conseqüência também carrega consigo a desigualdade social e a luta de classes. Sempre apresentando um sentido de polifonia ( várias vozes dentro do mesmo discurso) num desenvolvimento desigual e combinado entre a base material, o signo e apropriação da linguagem. A expropriação material se traduz na exclusão da posse das palavras.

Em alguns momentos do livro parece que os personagens não sabiam se as coisas tinham nomes ou se esses nomes eram uma criação humana ou divina, viviam presos num circuito em que a materialidade do signo não permitia a ultrapassagem pela imaginação.

Não sei se foi isso que Graciliano pensou, mas foi isso que vi.

Receita para Matar um Homem


Tomam-se umas dezenas de quilos de carne, ossos e sangue, segundo os padrões adequados. Dispõem-se harmoniosamente em cabeça, tronco e membros, recheiam-se de vísceras e de uma rede de veias e nervos, tendo o cuidado de evitar erros de fabrico que dêem pretexto ao aparecimento de fenómenos teratológicos. A cor da pele não tem importância nenhuma.

Ao produto deste trabalho melindroso dá-se o nome de homem. Serve-se quente ou frio, conforme a latitude, a estação do ano, a idade e o temperamento. Quando se pretende lançar protótipos no mercado, infundem-se-lhes algumas qualidades que os vão distinguir do comum: coragem, inteligência, sensibilidade, carácter, amor da justiça, bondade activa, respeito pelo próximo e pelo distante. Os produtos de segunda escolha terão, em maior ou menos grau, um ou outro destes atributos positivos, a par dos opostos, em geral predominantes. Manda a modéstia não considerar viáveis os produtos integralmente positivos ou negativos. De qualquer modo, sabe-se que também nestes casos a cor da pele não tem importância nenhuma.

O homem, entretanto classificado por um rótulo pessoal que o distinguirá dos seus parceiros, saídos como ele da linha de montagem, é posto a viver num edifício a que se dá, por sua vez, o nome de Sociedade. Ocupará um dos andares desse edifício, mas raramente lhe será consentido subir a escada. Descer é permitido e por vezes facilitado. Nos andares do edifício há muitas moradas, designadas umas vezes por camadas sociais, outras vezes por profissões. A circulação faz-se por canais chamados hábito, costume e preconceito. É perigoso andar contra a corrente dos canais, embora certos homens o façam durante toda a sua vida. Esses homens, em cuja massa carnal estão fundidas as qualidades que roçam a perfeição, ou que por essas qualidades optaram deliberadamente, não se distinguem pela cor da pele. Há-os brancos e negros, amarelos e pardos. São poucos os acobreados por se tratar de uma série quase extinta.

O destino final do homem é, como se sabe desde o princípio do mundo, a morte. A morte, no seu momento preciso, é igual para todos. Não o que a precede imediatamente. Pode-se morrer com simplicidade, como quem adormece; pode-se morrer entre as tenazes de uma dessas doenças de que eufemisticamente se diz que “não perdoam”; pode-se morrer sob a tortura, num campo de concentração; pode-se morrer volatilizado no interior de um sol atómico; pode-se morrer ao volante de um Jaguar ou atropelado por ele; pode-se morrer de fome ou de indigestão; pode-se morrer também de um tiro de espingarda, ao fim da tarde, quando ainda hà luz de dia e não se acredita que a morte esteja perto. Mas a cor da pele não tem importância nenhuma.

Martin Luther King era um homem como qualquer de nós. Tinha as virtudes que sabemos, certamente alguns defeitos que não lhe diminuíam as virtudes. Tinha um trabalho a fazer – e fazia-o. Lutava contra as correntes do costume, do hábito e do preconceito, mergulhado nelas até ao pescoço. Até que veio o tiro de espingarda lembrar aos distraídos que nós somos que a cor da pele tem muita importância.

(José Saramago)

domingo, novembro 09, 2008

Campeão


Um torcedor com a camisa do Corinthians voltava para São Paulo em uma longa viagem de carro vindo de Criciúma onde assistiu ao jogo que deu o titulo da segundona a seu time.
No meio do caminho um pneu furou. Calmamente ele estacionou o carro no acostamento, tirou o macaco e se preparava para colocar o estépe quando parou ao seu lado um outro carro do qual saiu um forte rapaz, também com a camisa do timão atirando uma pedra no vidro do passageiro do carro. O rapaz assustado levantou com o pneu na mão e gritou:
-Pô mano, qualé????
E o mano respondeu:
-Calma ai maluco..tu ja ta levando as rodas, então dexa que o toca-cd é meu!!!

Homenagem do Mainardi a todos corintianos pelo titulo conquistado ontem.

quinta-feira, novembro 06, 2008

Martin, Lewis e Barak

"Eu tenho um sonho de que meus quatro filhinhos, um dia, viverão numa nação onde não serão julgados pela cor de sua pele e sim pelo conteúdo de seu caráter.

Martin Luther King.

Em nosso pequeno mundo da fórmula um as coisas caminharam rápido. Não muito, afinal demorou cinqüenta e poucos anos para que um negro fosse campeão mundial, Mas comparado a outras situações, Lewis chegou ano passado e quase ganhou o campeonato mundial. Este ano foi com justiça o campeão. Porém a cor de sua pele nada tem com isto.

Sua capacidade, seu talento ou sua sorte para quem queira, são coisas que independem de cor, raça, credo ou opção sexual. Irrelevante.

Não há vantagem em ser desta ou daquela etnia. Não sei por que o espanto: “O primeiro negro a vencer na F1”!Por ser um esporte caro? Elitista? Não existem negros ricos ou na elite?Por acaso ficaremos estupefatos da mesma forma quanto um japonês for campeão? E quando for uma mulher?

Já no grande mundo real as coisas são muito mais lentas. Dois séculos até que um afro descendente chegasse à presidência dos EUA. Muita injustiça e muita violência rolaram por baixo da ponte norte americana até que um filho negro da terra alcançasse o posto de maior importância na hierarquia daquele País.

Aqui sim a cor da pele faz e fez a diferença no desenrolar da história. Aqui não bastava a capacidade de Obama. Não era suficiente seu talento ou o conteúdo de seu caráter.

Era necessário vencer a resistência histórica de um povo a cor de sua pele. Venceu. E pregando paz e entendimento entre os diferentes povos do mundo.

E se este século teve seu inicio com o fatídico 11 de Setembro, então, povos do mundo, aproveitai esta inédita e provavelmente única chance de, como nos nossos “Windows”, usar um ponto de restauração. Reiniciar nosso século a partir de algo bom...

Parece que o(s) dia(s) que M.L.K. sonhava finalmente chegou!!!
Colaboracão de Ron Groo

segunda-feira, novembro 03, 2008

O Troféu do Oscar


“A casa do Oscar era o sonho da família. Havia o terreno para os lados do Iguatemi, havia o ante-projeto presente do próprio, havia a promessa de que um belo dia iríamos morar na casa do Oscar. Cresci cheio de impaciência porque meu pai, embora fosse dono do Museu do Ipiranga, nunca juntava dinheiro para construir a casa do Oscar.

Mais tarde, num aperto, em vez de vender o museu com os cacarecos dentro, papai vendeu o terreno no Iguatemi. Deste modo, a casa do Oscar antes de existir foi demolida, ou ficou intacta, suspensa no ar como a casa do beco de Manuel Bandeira. Senti-me traído, tornei-me um rebelde, insultei meu pai, ergui o braço contra a minha mãe e saí batendo a porta da nossa casa velha e normanda: ‘Só volto pra casa quando for a casa do Oscar!’


Pois bem, internaram-me num ginásio em Cataguases, projeto do Oscar. Vivi uns seis meses naquele casarão do Oscar, achei pouco. Decidi a ser o Oscar eu mesmo, regressei a São Paulo, estudei geometria descritiva, passei no vestibular e fui o pior aluno da classe. Mas ao professor de topografia que me reprovou no exame oral, respondi calado: ‘Lá em casa tem um canudo com a casa do Oscar...’


Depois larguei a arquitetura e virei aprendiz de Tom Jobim. Quando minha música sai boa, penso que parece música de Tom Jobim. Música de Tom, na minha cabeça, é casa do Oscar.”

texto de Chico Buarque de Holanda

Oscar Niemeyer, não cobrou nada para desenhar o troféu do vencedor do Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1. A peça foi elaborada em "plástico verde", um polietileno feito a partir do etanol da cana de açúcar, ou seja, é renovável, reciclável e não polui.

Felipe Massa, piloto brasileiro da Ferrari, por 500 metros ou 20 segundos ou único 1 ponto não pode reconquistar o Campeonato Mundial de Fórmula 1 para o Brasil depois de 17 anos, mas levou para casa o "Troféu do Oscar".