sexta-feira, novembro 27, 2009

O UNIVERSO ENCANTADO DE RAIMUNDO

Recentemente reencontrei um personagem ilustre e inspirador, Raimundo da Hora.
O engenhoso baiano de setenta e oito anos costuma raramente visitar nossa cidade para rever o seu filho que aqui reside.
Conterrâneo de Castro Alves, nascido na cidade de Muritiba, Raimundo traz a tradição baiana "da Hora" em seu sobrenome. Caboclo lúcido, militar aposentado, caridoso, revelador, politizado e de prosa suculenta. A tentativa de adjetiva-lo não seria suficiente a sublime pessoalidade.
Em 1951 Raimundo se dirigiu para o Rio de Janeiro, e envolvido pela efervescência cultural da época ali ficou até 1990 onde depois voltou para sua cidade natal.
Portador da ancestralidade Baiana, sua tendência espiritual se desvelou no Rio de Janeiro onde conheceu e aderiu a chamada seita umbanda. Fundada na mesma cidade em 1935 pelo médium Manoel Jacinto Coelho que mais tarde se tornará amigo de Raimundo onde passa a frequentar a casa do mesmo.
Manoel doutrinou e nutriu o espirito de Raimundo na literatura umbandista, onde se tornou um dos primeiros prosélitos da designada religião Brasileira por excelência.
Apesar de ter nascida no Brasil, a umbanda empresta elementos de outras crenças para produzir o seu mercado de bens simbólicos se fundindo com culturas e tradições religiosas africanas no uso litúrgico dos grupos de língua como o iorubá, o jeje e o banto; no espiritismo Kardecista trazido pelos europeus com fragmentos hindu-cristão, inclusive os adereços e a formas populares de catolicismo.
Nas primeiras décadas da sua origem a umbanda sofreu intensa perseguição por ser intitulada seita mediúnica. Saiu da clandestinidade e passou a ter maior expressividade só na década de 70.
A moderna umbanda foi reinterpretada. Manoel antes de morrer decretou que a prática nos terreiros de umbanda fosse banida devido a nova revelação que lhe foi dada no terceiro millenium através do "racional superior" que representa a supremacia divina.
Desde então, os terreiros ditos de umbanda não estão mais sob a égide de linhas ou falanges de espíritos. Hoje a umbanda propõe-se religar o homem ao racional superior (Deus) através do estudo da vasta literatura denominada "Universo em Desencanto" composta por mais de mil livros.
Vale lembrar que o pai da soul music brasileira Sebastião Rodrigues Maia o imortal Tim Maia bebeu das literaturas do universo em desencanto onde lhe renderam dois discos, o Tim Maia racional volume um e dois.
Detentor do patrimônio simbólico umbandista, o experimentado Raimundo da Hora vive atualmente na pacata cidade de Muritiba localizada no recôncavo Baiano, onde é ativo e engajado em programas sociais.
Fiel ao legado intelectual deixado por Manoel, Raimundo é estudioso assíduo da encantadora filosofia do racional superior, o universo em desencanto.

Fabiano Baldi

16 comentários:

Alê Marques disse...

Como dizia Tim: "Manooeel!! O maior homem do mundo, homem sério e profundo, semeou conhecimento...."
Ótimo texto Fabiano!!
A exemplo de Pierre Bourdieu, você deveria escrever um trato sobre Econômia das Trocas Simbólicas.
É isso, mande mais!

Anônimo disse...

Baldi, li um pouco sobre a filosofia por indicação da minha irmã - ela me acha cético demais (redundância?) -, mas não consegui avançar.

Os ateus diriam que refuto por ser elevado, os crentes diriam o contrário. Por respeito à diversidade e, sem certeza nenhuma, fico em cima do muro com meu agnosticismo dissimulado.

Foi bom ler um texto seu.

Abraço.

S. Maia

Alê Marques disse...

Então SM, já curtiu Tim Maia Racional??
Vai hoje no escritório que lhe passo o CD, I e II.

Anônimo disse...

Alê, falando em instrumental e voz, talvez esse seja o melhor trabalho do Tim. Mas o lance de pastorear não combinou com ele. Tanto que nem ele aguentou, voltou com tudo pros bauretes e pra brizola. Fora os comes e bebes.

Gosto mais da fase dele pedindo bauretes para o público, apelidando os mocós de garrastazus e comendo as marmitas vendidas pelo pai para aliviar o peso.

Gosto do moleque que se jogou pros States (tentei fazer igual, mas não rolou) aos 16 anos com apenas um papel com endereço e telefone de uns amigos dos pais, bem distantes.

Obrigado pelos cds, mas já tenho.

Abraço.

S. Maia

Anônimo disse...

Baldi, gostei da sua abordagem.

Mas o que acha da cultura racional?

Tem sustentação para você?

abraços

Prata

Marcio disse...

cara, tinha certeza que era o Charlinho falando do Raimundera, aquele que tomamos uma cachça muito da boa na casa dele, em S. Sebastião...

Alê Marques disse...

Porra Gurdura, Fala sério!!
É a cara do Raimundera, eu acho que é ele mesmo!
Estivemos na presença do Grão mestre varonil e nem nos demos conta! Também, com tanta cachaça pro peito! Ele tomou tanto que mais parecia o Zé PILINTRA, o Tranca rua.
Eu no fundo senti uma certa energia sim. agora me lembro.

pratapreta disse...

Caros, O Raimundo (meuRei!)

Está bem, estive com ele há um mês atrás.

Continua ainda fazendo oferendas, ebós, só que agora com Oxum.

Vamu lá qualquer dia, com certeza será um prazer para ele.

Anônimo disse...

Deus , o único grande problema, até os que não acreditam gostam de falar dele.
SMaia, quem diria seu tiazão no Texto , o grande TIM MAIA:
Manoel, o maior homem do mundo, homem sábio e profundo, semeou o conhecimento.
Piquitito

Anônimo disse...

Sei bem que meu amigo Baldi fez essa refêrencia em minha defesa. Ou não.

Abraço.

S. Maia

Anônimo disse...

Sei bem que meu amigo Baldi fez essa refêrencia em minha defesa. Ou não.

Abraço.

S. Maia

Anônimo disse...

Então Chen,Econômia das trocas simbólicas foi o livro fundamental na elaboração da minha monografia, cujo nome:o sistema de representação neopentecostal e sua funçaõ no campo simbólico / uma análise da categoria neopentecostal baseada em Pierre Bourdieu.Uma excelente abordagem pós estruturalista nos campos de força dentro da área da significação.Cirúrgica sua constatação!

Charles,conheço pouco da literatura do universo em desencanto,o contato que tive com os escritos e as respectivas pessoas eu diria que em momentos foi inefável.Como todo livro "revelado", chega uma hora que a alegoria não cabe mais na cabeça.Aí é transcender...Cada alegoria religiosa está para uma estrutura historica e psicologica, ou não.Não importa a veracidade do arquétipo,o que o legitima é sua eficácia,portanto, é "preciso" estar aberto para tal experiência que é pessoal.

É Sebastião,talvez a refêrencia deva ter sido inconscientemente. Até agora não sei porque razões não continuou publicando no blog. Apesar de vez ou outra ser altamente presunçoso, eu era de acordo com que você ficasse.A minoria te degredou violentamente...
Fabiano Baldi

Anônimo disse...

Na real, Baldi? Foi melhor assim.

Gostei do presunçoso.

Um abraço.

S. Maia

Alê Marques disse...

Pois é Baldi, olha que nem li sua pesquisa e já senti algo de Pierre Bourdieu, a sua linha de pensamento tem muito da obra seminal deste: Economia das Trocas Simbólicas, do pos estruturalismo de Bourdie.
Sempre lhe senti signatário desta matriz epistemológica francesa.
Já há algum tempo li Economia das Trocas Simbólicas, gostaria de ler de novo juntamente com seu trabalho de pesquisa. Na época achei que a obra incorria num determinismo estruturalista a la Lèvi Strauss.
Mas segundo o enfoque dado por vocẽ acho que abrirá outras formas de interpretação.
Obrigado pela sua preciosa contribuição, para este carecido blog.

Sil Ribeiro disse...

O que dizer...desse texto farto...De ótimas palavras e conclusões...essas cheias de arinho e compeensão, que vêem da alma....poética...
É aí que entra a tal simplicidade...com que olhos enxergamos o próximo...Raimundo...pessoa que nunca vi...nem escutei....mas que através desse texto...aprendi a amar...independente do que ele acredite....independente de tê-lo olhado nos olhos ou não...Mas como digo ao Fabi...existe...amor de alma...
Amei...já havia dito...e iria assinar embaixo...

Sil Ribeiro

Cardápio Delicadeza disse...

Fique contente pois tenho um irmão chamado Raimundo, amo esse cd "racional" do Tim, amo o Fabi e gostei de todas essas prosas aqui!

Se Lirinha lêsse esse texto Fabi, iria se derreter todo! pense numa sustância!

Abração e saudade de tu!