segunda-feira, novembro 26, 2007

Carta de navegação: APORTADO


Açoitado pelas extensas tiras do tempo, como desencontros e desamores, meio que pirateando em mares de relações, fui levado à deriva.
Dúvidas pairaram como nuvens, tampando qualquer saída, comecei a viver ciclos mal contados e intermináveis, consumido em séculos, como se a distância fosse medida por milhas. O tempo fez sua parte. Meu ser se cansou, pesado ficou, senti uma necessidade imensa de me esvaziar, minha nau sem rumo e perdida se debateu contra todas as possibilidades de se manter estática. Minha alma, minha essência era presa fácil para carniceiros como dor e desilusão. Sabia que precisava resistir, pois a esperança ainda circundava minha nau. Como um herói, suportava em eternos minutos meridianos todas provações. Mesmo com tantas aflições me sentia vazio, como estar completo de sentimentos e se sentir oco?Como pode o vácuo apetecer de si mesmo para se completar? Talvez não seja, realmente, a consciência de se ter este vazio que me perturbe, mas sim a falta de algo que não tenho.
Não me pergunte quanto tempo durou, não faz muita diferença. Precisava, e sabia que além das tormentas, encontraria terra firme, uma hora, mais cedo ou mais tarde seria norteado pra isso, mas como? Será que só minha intuição como bússola seria o suficiente? Ela me conduziria? Creio que não, era necessário que algo como mágica, com poderes sobrenaturais, viesse ao meu socorro. A supremacia estendeu seu olhar sobre mim e como brisa leve, como um ser alado que freneticamente adeja numa atmosfera azul onde a vista avista o fim do horizonte.
Atraído pela luz e presenteado com seu reflexo, um ponto em meio à visão panorâmica, como seta para o alvo me encaminho para a referência, da pra ver de longe a benevolência das águas que a circundam, a calmaria que apresenta suas orlas, posso sentir a brisa entrelaçada com a maresia rasgando num sorriso de oeste a leste, minha euforia se desenha como a algazarra de vários pássaros ao amanhecer mais um dia. Meus olhos transmitem ao meu cérebro, que finalmente o mapa me levou ao tesouro e que toda ordem e fluxo internos serão alterados; de imediato sinto as palpitações cardíacas aumentarem, a respiração quase falta, o tremor como sinal de alerta e a transpiração jorra como se estivessem lavando minha alma. Como num ritual balsâmico sinto-me completado e renovado, pronto para procurar ancoradouro. Lanço minha nau num espelho de águas calmas, ouço apenas o som da proa cortando águas, como guilhotina. Deixo a nau deslizar como numa rampa e não há outro destino a não ser o porto, sim, um porto seguro! Nesse momento, apenas contemplo o livramento dos acoites para glória do arrebatamento.
Aportei!

Para Maura.


José Alencar

(Um grande amigo, que dividiu comigo estas letras, e que agora apresento a vocês. Nilson Ares)

Um comentário:

Anônimo disse...

É my dear friend Sarsa,


"saudade até é bom, o duro é caminhar vazio" Caetano

Abraços


Rei da Vela