Borges perguntou a um estudante de letras norte americano se já lera Arabian Nights (As Mil e Uma Noites), e este respondeu que não fizera o curso de árabe, e Borges respondeu que também não, disse que lera no curso de Noites. Era isso que estava lendo quando Fantasmão disse que A República de Platão era o bicho! Vire e mexe neguinho da Pólis já queria ver a parada. Certa vez chegou a expulsar os artistas, por julgar que estes representavam de maneira caricata o ideal do belo, do supra-sensível. Criando imagens e delas o simulacro, copiando mundo das idéias. Inverossímil, ma no troppo. O afã da representação acabou inaugurando outras realidades, hiper realidades suportadas por uma sintaxe binária aparentemente muito simples: zero e um. Esses dois signos suportam hoje uma profusão de sentidos e significados que a representação platônica só postulou no mundo das idéias, no supra-sensível, no mundo fora da caverna. A virtualidade não é uma sombra da realidade no fundo da caverna, é outra realidade, ainda latente. A sua extensão está em potência e não em ato, mas, o fato, é que essas duas condições (ato e potência) andam se coincidindo no tempo-espaço. Lembrou-me de outro conto de Borges que conta a história de um colégio de cartógrafos, que se esmeravam em construir um mapa que fosse do tamanho do império, em que cada ponto do mapa coincidia com as localidades e os objetos geográficos ali representados. Mas Borges sabia, que o mapa naturalmente se tornaria obsoleto. Pois há noticias, que existem ruínas desse mapa habitadas por animais e mendigos. Já que consideraram tal representação mais aconchegante e perfeito do que o espaço da realidade ordinária. Pelo menos foi o que imaginei, quando agora vemos que o esmero da representação é ser mais perfeita do que a coisa representada, do excesso de significação frente ao significante, da técnica portadora de sentido e do meio abarcando a totalidade da mensagem. É o que torna imperativa a obsolescência programada da realidade e suas eternas atualizações. Isto não estava no mundo sensível de Platão, e acho que nem no supra-sensível.