Acordou e não abriu os olhos. Mesmo sem saber porque, esperou a dor. E ela veio. Sua mão ardia, sua cabeça latejava, as palpebras pesavam de tanto chorar. Abriu os olhos e o teto branco não amenizou a dor, só a aumentou, lembrando-a que tudo era real demais. Ele estava dormindo ao seu lado, mas não era ele, tinha uma expressão ruim, um rancor em sombras. Devia estar sonhando, pois as mãos e pés movimentavam-se em espasmos.
Ela levantou sem fazer barulho, foi até a cozinha, acendeu um cigarro no fogo que a água fervia. Ficou olhando pela janela sem conseguir respirar, não conseguia olhar para os próprias mãos com ferida aberta.
Sentou com uma xícara de café sem açucar e acendeu outro cigarro. Não havia o que pensar, qualquer pensamento resumiria-se a dor, tristeza e arrependimento.
Sem fazer barulho, pegou tudo que era seu, pouco ali era realmente seu, talvez nem ela fosse dela.
Despediu-se dos cachorros, entrou no carro e foi embora.
Dirigiu pela cidade amanhecida. O calor era já insuportável e a claridade incomodava os olhos inchados.
No primeiro sinal vermelho parou e pensou que não tinha realmente para onde ir. Encostou a testa no volante e voltou a chorar, talvez não tivesse parado. O carro atrás buzinou. Por um segundo pensou em voltar, mas não queria voltar para aquela casa, queria voltar para algo que nunca existiu, algo que era só sonho. Engatou primeira, abriu as janelas, respirou fundo. Pensou que há tempos não respirava, sozinha. Seguiu sem rumo, mas foi em frente.
Sabia que a dor só estava começando, mas iria usá-la para acordar e não fugir.
11 comentários:
um pouco previsível, mas está muito bom! e a aula? postando essa hora!!! beijunda. S.Farias
ps: no início pensei que era do Sarsa, ao seu estilo.
Pois é Farias, estilo corta-pulso;;;Aquele sal na lingua de onem esta justificado.
Apenas espero que ela não entre no circulo de abstinência do colega.
André
Maria, bem vindo ao Luto!
Você, como sensata que é, ira respeitá-lo.
Senão,... a vida cobra mais tarde
Bela confissão
Parabéns
Prata
Uau Magé, forte isso hein? dá pra ver a coragem por trás da dor da personagem.
Muito bom, não só o quê, mas o como você escreve, gostei mesmo!
Farias, escrevi no onibus, postei no intervalo.
Bom, lembrar tão nobre autor como Sarsa, so agradeço!!
Andre, sal eh para pressão baixa.
Ah, o luto...
Marcio, obrigada, adorei escrever!! Bom q vc gostou de ler!
Não por isso. Vamos tentando ver o que está por detrás do óbvio, não é?
Firma o pé.
O começo me lembrou Saramago.O lance da cegueira.
Hemerson
eu também, hemers!
Previsível foi, mas o jeito de escrever que eu tentei fazer melhor....
Mas Saramago, poxa vida....agora que estou lendo Caim perigo eu parar de escrever de vergonha.
MUito bom mesmo!!
A personagem pulsa no texto,mesmo ela interpretando um anti climax de uma viagem. Gostei !!
também gostei. a alacridade fúnebre do texto - curto - impressiona.
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